quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

20 Anos da Constituição de 1988 e a Comunicação Social

Neste ano a Constituição de 1988 completará seus 20 (vinte) anos. Desde sua entrada em vigor até hoje, assistimos a múltiplas modificações de seu texto, mediante cinqüenta e três emendas constitucionais.
Uma das primeiras alterações com reflexos no setor de Comunicação Social foi a Emenda Constitucional nº 8/1995 que modificou o inc. XII do art. 21 da CF, para separar a disciplina dos serviços de telecomunicações em face dos serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens. Por sua vez, houve a Emenda Constitucional nº 36/2002 que tratou da propriedade das empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora e de sons e imagens, bem como permitiu a entrada de capital estrangeiro.
A par das apontadas emendas constitucionais, constata-se que importantes dispositivos relativos à Comunicação Social não foram regulamentados pelo Congresso Nacional. Vale dizer, o órgão legislativo não respeitou integralmente a vontade normativa da Constituição do Brasil, incorrendo em estado de omissão inconstitucional.
Primeiro, não foi ainda disciplinado no âmbito legislativo o §3º do art. 220 da Constituição que exige a edição de lei federal para “estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art. 221”. Acredita-se que é imprescindível um estatuto jurídico que contenha o catálogo de direitos dos usuários e consumidores dos serviços de televisão.
Segundo, não houve a edição de norma regulamentando o dispositivo que coíbe o monopólio e oligopólio nos meios de comunicação social, previsto no §5º da CF. A regulamentação da referida norma é essencial para a defesa do pluralismo das fontes de informação e, conseqüentemente, para a consolidação do Estado Democrático de Direito em nosso País.
Terceiro, não foi aprovada uma lei disciplinando os princípios concernentes à produção e a programação das emissoras de rádio e televisão, conforme dispõe o art. 221 da CF. Com isso, embora possa ser defendido que tais princípios sejam auto-aplicáveis, na prática, fica difícil a sua concretização sem a existência de uma lei que defina objetivamente o seu conteúdo mais detalhado.
Quarto, apesar de a Emenda Constitucional nº 36/2002 ter introduzido no ordenamento jurídico brasileiro uma nova noção, na medida em que alterou o art. 222, qual seja, a expressão “meios de comunicação social eletrônica”, até o momento, não existe especificação legislativa a respeito de seu significado. Assim, na falta de clareza quanto ao alcance do apontado conceito, pairam dúvidas quanto à incidência dos princípios da produção de programação das emissoras de rádio e televisão.
Em outras palavras, em razão do fenômeno da convergência tecnológica, os sinais de televisão podem ser transmitidos por diversas formas técnicas: radiodifusão, cabo, satélite, MMDS, internet. Portanto, até que ponto os referidos princípios aplicam-se por exemplo à transmissão de sinal de televisão por internet ou por aparelhos celulares ?
É fundamental uma nova lei geral de comunicações que discipline esta e outras questões importantes relativas ao marco regulatório dos serviços de televisão, eis que a tradicional Lei nº 4.117/62, alterada pelo Decreto-Lei nº 236/67, que ainda regula o setor de radiodifusão, está obsoleta do ponto de vista tecnológico, econômico, social e constituiconal.
Quinto, a Constituição contém um princípio importante que garante a estruturação policêntrica do sistema de comunicação social consubstanciado no princípio da complementaridade dos sistemas de radiodifusão privado, público e estatal, previsto em seu art. 223.
Contudo, apesar de sua força normativa, ainda não foi implantada em nosso País uma sólida televisão pública, inclusive não há a previsão de televisões comunitárias no sistema de radiodifusão.
De fato, a televisão comercial possui a hegemonia no cenário audiovisual brasileiro. Contudo, na prática, sequer é regulada, eis que inexistente um órgão regulador e um marco regulatório atualizado que a discipline.
Por sua vez, a televisão estatal foi criada pela MP nº 398/2007, estando em discussão no Congresso Nacional. Alerte-se para o fato de que, embora denominada de televisão pública pela MP nº 398/2007, em verdade, trata-se de uma televisão estatal, eis que criada, mantida, operada e controlada pelo Estado.
Uma verdadeira televisão pública é aquela instituída, mantida, gerida e controlada pela sociedade civil e não pelo Estado. Lembre-se que existe a televisão pública nos serviços de televisão a cabo, porém não há no sistema de radiodifusão.
No sistema de radiodifusão não existe uma televisão pública, razão pela qual ela precisa ser criada pelo Congresso Nacional a fim de permitir a entrada de novos operadores públicos (associações de cidadãos e (ou) organizações não-governamentais) que não se confundem com o setor estatal. Com isso será atendido o princípio do pluralismo das fontes de informação.
Sexto, uma outra proposta reside na alteração do art. 223 de modo a retirar a competência do Poder Executivo e do Congresso Nacional quanto ao ato de outorga e renovação de concessões e permissões do serviço de radiodifusão, atribuindo a uma futura agência reguladora independente. Esta deverá promover a efetiva fiscalização dos serviços de televisão em favor da realização dos direitos fundamentais, tais como: à comunicação, à educação, à cultura, à liberdade de expressão artística, etc.
Sétimo, o Conselho de Comunicação Social, previsto no art. 224 da CF, apesar de ter prestado relevantes trabalhos, atualmente encontra-se paralisado, não cumprindo com sua missão institucional de servir como órgão auxiliar do Congresso Nacional em termos de comunicação social.
Enfim, observa-se que o constituinte fez um bom trabalho, o que não o isenta, por óbvio, de críticas, inclusive de eventuais ajustes no texto constitucional. Porém, ainda falta o Congresso Nacional cumprir com sua parte institucional, resolvendo as omissões acima relatadas, a fim de executar a força normativa da Constituição do Brasil e realizar os direitos fundamentais atrelados, principalmente, ao serviço de televisão. Caso continue não cumprindo com essas relevantes tarefas, cabe às partes interessadas e legitimadas da perspectiva constitucional o ajuizamento de ações diretas de inconstitucionalidade por omissão.

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

O Conselho Curador da TV "Pública"

A Medida Provisória nº 398/2007, que trata da criação da Empresa Brasil de Comunicação – EB e do serviço de radiodifusão “pública”, criou a figura do Conselho Curador. Posteriormente, houve a edição do Decreto nº 6.246/2007 regulamentando a referida medida provisória.

Em verdade, entendo que não se trata propriamente de uma televisão pública, mas sim uma televisão estatal. Para mim, a televisão pública é aquela criada, mantida, operada e controlada pela sociedade civil. No caso da televisão referida pela MP trata-se de uma emissora criada, mantida, operada e controlada pela União, razão pela qual é estatal e não pública. Faço essa distinção entre televisão estatal e pública, em razão da exigência constitucional contida no princípio da complementaridade dos sistemas de radiodifusão privado, público e estatal.

De qualquer forma, o referido órgão é um importante mecanismo de participação da sociedade civil na gestão e controle da televisão “pública”. Com isso, são ampliadas as garantias de autonomia em face do governo federal.

Sua composição é de vinte membros designados pelo Presidente da República, sendo: quatro ministros de Estado, um representante dos funcionários e quinze representantes da sociedade civil, segundo critérios de representação regional, diversidade cultural e pluralidade de experiências profissionais. Veda-se a participação de parentes dos diretores e de agente público detentor de cargo eletivo ou investigo em cargo em comissão.

O Conselho Curador é um órgão de natureza consultiva e deliberativa (suas decisões são vinculantes para a diretoria), tendo as seguintes competências:

- aprovar as diretrizes educativas, artísticas, culturais e informativas integrantes da política de comunicação propostas pela Diretoria Executiva da EBC;
- opinar sobre matérias relacionadas ao cumprimento dos princípios e objetivos do serviço de radiodifusão “pública”;
- aprovar a linha editorial de produção e programação proposta pela Diretoria Executiva;
- deliberar, por maioria absoluta de seus membros, quanto à imputação de voto de desconfiança aos membros da Diretoria Executiva;
- eleger seu Presidente;
- e acompanhar o processo de consulta pública para fins de renovação de sua composição.

Entre os princípios do serviço de radiodifusão “pública” a serem protegidos pelo referido órgão estão:

- o princípio da complementaridade entre os sistemas privado, público e estatal;
- promoção do acesso à informação por meio da pluralidade de fontes de produção e distribuição do conteúdo;
- produção de programação com finalidades educativas, artísticas, culturais, científicas e informativas;
- promoção da cultura nacional, estímulo à produção regional e à produção independente;
- autonomia em relação ao Governo Federal para definir produção, programação e distribuição de conteúdo no sistema público de radiodifusão;
- participação da sociedade civil no controle da aplicação dos princípios do sistema público de radiodifusão, respeitando-se a pluralidade da sociedade brasileira.

Por sua vez, os objetivos do serviço de radiodifusão “pública” a ser tutelados pelo Conselho Curador são os seguintes:

- oferecer mecanismos para debate público acerca de temas de relevância nacional e internacional;
- desenvolver a consciência crítica do cidadão, mediante programação educativa, artística, cultural, informativa, científica e promotora da cidadania;
- fomentar a construção da cidadania, a consolidação da democracia e a participação na sociedade, garantindo o direito à informação do cidadão;
- cooperar com os processos educacionais e de formação do cidadão;
- apoiar processos de inclusão social e socialização da produção de conhecimento por intermédio do oferecimento de espaços para exibição de conteúdos produzidos pelos diversos grupos sociais e regionais;
- buscar excelência em conteúdos e linguagens e desenvolver formatos criativos e inovadores, constituindo-se em centro de inovação e formação de talentos, direcionar sua produção e programação pelas finalidades educativas, artísticas, culturais, informativas, científicas e promotoras da cidadania, sem com isso retirar seu caráter competitivo na busca do interesse do maior número de ouvintes ou telespectadores;
- e promover parcerias e fomentar produção audiovisual nacional, contribuindo para a expansão de sua produção e difusão.

Trata-se de um enorme desafio quanto à garantia de prestação de um serviço público de televisão por radiodifusão adequada e de qualidade, com a oferta de programas voltados à educação, informação e entretenimento, em prol da realização dos direitos fundamentais (por exemplo: informação, liberdade artística, comunicação, educação, cultura, etc.).
E mais, um das principais preocupações consiste em garantir justamente sua autonomia em face do governo federal, ofertando uma programação audiovisual com o devido equilíbrio, assegurando-se a abertura para os diferentes pontos de vista existentes na sociedade.

Enfim, o Conselho Curador se caminhar solitariamente terá sérias dificuldades em enfrentar o desafio. Mas, se convocar a sociedade civil organizada será ampliado o potencial de contribuição para o cumprimento dessa missão.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

Modelo Norte-americano de TV Por Radiodifusão

O modelo norte-americano de televisão está baseado na Primeira Emenda da Constituição que garante a liberdade de expressão. Tal dispositivo prevê que nenhuma lei poderá restringi-la, o que configura uma importante proteção para aquele que pretende divulgar notícias e (ou) opiniões e que dispõe da propriedade privada de uma estação de televisão. Trata-se de uma liberdade que serve como base por intermédio da qual se assentam as demais liberdades dos cidadãos norte-americanos.

A partir dela, quanto aos serviços de radiodifusão, a jurisprudência, as leis e a prática desenvolveram uma série de outros sub-princípios: interesse público, pluralismo de vozes, mercado livre de idéias ou igualdade de oportunidades ou certas fórmulas (doutrina da eqüidade, regra de ampla utilização, discriminações positivas etc.).

Portanto, a regra é a proteção à liberdade. A exceção à regra é a restrição pelo poder público. Isto decorre da especial compreensão dos norte-americanos em torno do papel do Estado em face do mercado e da sociedade que é diferente do entendimento europeu e brasileiro.

Ela só pode ser restringida quando houver a demonstração de que a intervenção estatal será a miníma possível e cujo objetivo seja a satisfação do interesse público. Assim, nesse contexto, a legislação dispõe que o poder público possui a competência necessária para a outorga das licenças para o exercício da atividade de televisão, bem como para corrigir as falhas de mercado, de modo a condicionar o exercício da atividade ao atingimento do interesse geral.

A intervenção pública sobre o setor de radiodifusão centra-se basicamente no trabalho da Federal Commission Communication (FCC) que é uma agência encarregada das políticas reguladoras relacionadas aos serviços de telecomunicações (inclusive serviços de radiodifusão) oferecidos pelos mais variados meios: televisão, rádio, comunicações privadas, telefones celulares, satélites terrestres e orbitais, cabo, etc. O modelo de televisão exige o equilíbrio entre a necessidade de intervenção pública e a liberdade de mercado de televisão, protegida pela Primeira Emenda da Constituição.

Trata-se de um paradigma à margem da idéia de serviço público que serve à estruturação da televisão nos países europeus, inclusive o Brasil. Nos EUA a radiodifusão é qualificada como uma "public utility"; uma instituição que não se identifica com a noção européia de serviço público, eis que diferentes os pressupostos sociais, políticos e econômicos. O significado de "public utility" na língua portuguesa aproxima-se da idéia de um serviço privado, mas de interesse público.

Antigamente, era possível ver com maior clareza a diferença entre as fronteiras da "public utility" e da noção de serviço público, atualmente, elas não são tão nítidas.Apesar da complexidade na identificação das notas diferenciadoras, as categorias possuem identidade própria.

O serviço de televisão por radiodifusão é uma public utility totalmente diferente das demais public utilities, eis que está diretamente atrelado à concepção democrática e à liberdade de expressão. Em função disso, a "broadcasting regulation" implica sérias questões, particularmente quanto ao acesso ao meio de comunicação, regulação do conteúdo audiovisual e à produção e à veiculação de notícias de interesse público que possibilitem o debate público.

Nos EUA existem diversas concepções em torno da regulação dos meios de comunicação, cujo eixo principal deriva da interpretação da liberdade de expressão protegida pela Primeira Emenda à Constituição norte-americana.
De um lado, há aqueles que interpretam a Primeira Emenda no sentido de garantir a autonomia discursiva dos indivíduos, exigindo a abstenção do Estado na esfera individual (teoria libertária). De outro lado, há aqueles que a interpretam no sentido de ser um instrumento para a promoção da diversidade na esfera pública, o que exigiria uma atuação positiva do Estado em favor da ampliação do espaço a ser conferido a diversos grupos no debate democrático (teoria democrática). Esta classificação é adotada pelo autor Owen Fiss.
Em outras palavras, há uma divisão entre distintas concepções em termos de interpretação da Primeira Emenda da Constituição norte-americana, há aqueles que interpretam a liberdade de expressão de modo individual a proteger o autor do discurso; e há aqueles que a interpretam de modo a favorecer os objetivos democráticos, privilegiando os destinatários dos discursos.
Segundo Cass Sustein, ao tratar das teorias sobre a liberdade de expressão, existe a teoria referente ao "marketplace model", relacionada ao estabelecimento de regras básicas em termos de propriedade privada e contrato, que parte do pressuposto que o próprio mercado é que deve regular a oferta e demanda, razão pela qual o Estado deve respeitar as forças econômicas. A liberdade de expressão é entendida em termos de competição no mercado, daí a utilização da metáfora "marketplace of ideas" enquanto fator de explicação e legitimação do mercado e de restrição da intervenção estatal.
A regulação estatal é admitida na hipótese de existirem falhas de mercado, isto é, quando houver monopólios e (ou) oligopólios no setor econômico. Ademais, admite-se uma regulação quanto ao conteúdo limitada aos casos de "obscenity, false ou misleading commercial speech and libel".
Por outro lado, o segundo modelo está baseado nos objetivos democráticos, os quais preconizam a democracia deliberativa, sendo a liberdade de expressão um dos elementos do sistema. Nesse caso, o mercado de informações não está imune ao controle estatal, daí porque é necessária a lei para a organização do sistema operado pelos radiodifusores.

É importante apontar alguns pontos em defesa da adoção da interpretação da liberdade de expressão de modo a proteger a autonomia individual e a democracia, algo que também se sustenta em face do direito brasileiro.

A propriedade privada pode ser também um perigo para o exercício da liberdade de expressão, pois, não só o Estado representa essa ameaça. Um mercado sem regulação representa um fator de risco para o exercício das liberdades de expressão. Nesse sentido, o risco inerente ao poder da ação estatal deve ser reduzido, especialmente mediante a limitação da regulação em relação aos novos meios de comunicação.

Não se confundem as categorias liberdades de expressão e a de poder privado das empresas de radiodifusão. Certamente, os direitos de propriedade são indispensáveis para a liberdade e prosperidade, entretanto o exercício ilimitado pode comprometer os objetivos democráticos.

Não é possível sustentar que os direitos de propriedade das empresas que possuem os meios de comunicação sirvam à exclusão da liberdade de expressão de pessoas, grupos e instituições que não possuem tais meios. Não é possível reduzir a interpretação da Primeira Emenda em favor da liberdade de expressão tão-somente daqueles que possuem recursos materiais ou dinheiro em relação àqueles que não possuem.

As questões constitucionais acima relacionadas que afetam a organização do modelo de comunicação norte-americano, particularmente a televisão por radiodifusão, são valiosas para a compreensão do modelo brasileiro, principalmente, porque auxiliam a investigação sobre a obrigatoriedade (e não apenas possibilidade) de atuação estatal em favor da diversidade da esfera pública, o que envolve o papel do Estado em face do mercado e do sistema de comunicação social.

O modelo de televisão dos EUA tem suas vantagens: regras em garantia da efetiva competição entre os agentes econômicos, diversidade dos meios de comunicação, independência da televisão pública em face do poder político, autoridade reguladora independente, proteção ao conteúdo local, etc. Entretanto, tal modelo também tem algumas desvantagens, principalmente, a hegemônica consideração das obras audiovisuais como mercadorias e não como uma manifestação das culturas presentes na sociedade. Em outras palavras, há uma excessiva valorização do mercado e, principalmente, do conteúdo audiovisual voltado ao entretenimento.

Modelo Francês de Televisão por Radiodifusão

Originariamente, a França adotou um modelo de organização dos serviços de televisão por radiodifusão baseado no monopólio estatal e no regime de serviço público acompanhado da concessão administrativa, porém com a exclusividade da gestão em mãos de entidades criadas pelo Estado. Enfim, o fator de organização do setor televisivo era o serviço público de televisão de âmbito nacional, acompanhando a tendência organizatória européia fundamentada na idéia de televisão pública. Tal paradigma vigeu entre a década de 50 e 80 do século passado.

Na França, na década de 80, houve a quebra do monopólio, o que permitiu a coexistência dos setores público e privado de televisão por radiodifusão, mantendo-se a noção de serviço público, contudo com a delimitação de seu âmbito de aplicação, em garantia da liberdade de comunicação social e do pluralismo de idéias e de opiniões. Em virtude disso, ocorreu a transformação do sentido de serviço público de televisão, em razão da criação do setor privado de radiodifusão, inclusive abandonou-se o instituto clássico da concessão administrativa.

Com efeito, destaque-se que o eixo de estruturação dos serviços de televisão consiste na liberdade de comunicação social e o pluralismo de idéias e de opiniões.

Nesse período surgem as primeiras emissoras de televisão por radiodifusão privadas de âmbito nacional e local. A França, ao contrário dos EUA e do Brasil, não adotou, inicialmente, um modelo de redes nacionais de televisão, caracterizadas pelos contratos de afiliação entre a emissora de televisão principal e as emissoras afiliadas. Ademais, o Estado era o proprietário das redes de difusão utilizadas para a transmissão dos sinais de televisão, uma vez que em suas origens não havia a participação da iniciativa privada na construção de tais infra-estruturas.

Além disso, aparecem novas modalidades de televisão a cabo e por satélite. Originariamente, a construção de redes de cabo esteve sob monopólio do Estado, somente, no ano de 1986, permitiu-se a entrada de operadores privados, contudo, restringindo-se a respectiva atuação de cada prestador a, no máximo, oito milhões de lares. E a partir de 2004, em razão da incorporação ao direito interno da diretiva européia sobre telecomunicações, ocorre a liberalização do mercado. Os canais temáticos da televisão a cabo passam a contribuir com a produção de obras audiovisuais.Por sua vez, na França, aproximadamente, existem quatro milhões de assinantes do serviço de televisão por satélite que se dividem entre os dois operadores: Canal Sat e TPS. É um dos únicos países europeus onde ainda coexistem duas ofertas de satélites pagas, nos demais países houve a fusão entre os operadores de satélite, o que resultou no oferecimento de uma única programação de televisão.
Há, ainda, o terceiro setor audiovisual; âmbito por excelência para o desenvolvimento da televisão local associativa. Também, a análise dessa questão contribui para a compreensão do setor de radiodifusão público não-estatal, previsto pela Constituição brasileira.
E mais, em razão do processo de internacionalização da mídia, especialmente a entrada do conteúdo audiovisual norte-americano, o sistema francês adota algumas regras de proteção ao conteúdo audiovisual nacional e europeu, este em razão de exigência do direito comunitário. Com isso, são criadas obrigações de programação, investimentos em matéria de compra de obras audiovisuais pelos canais de televisão por via hertziana terrestre, inclusive elas vinculam os serviços de televisão a cabo e por satélite.

Televisões Comunitárias

Um dos elementos do sistema de radiodifusão público é a televisão comunitária que, no entanto, sequer existe na realidade normativa; há tão-somente as rádios comunitárias que enfrentam sérios problemas para sua consolidação democrática em nosso País, principalmente em razão da demora da administração pública em apreciar os pedidos de autorizações para funcionamento.

Por enquanto existem apenas projetos de lei relativos à criação e à operação de televisões comunitárias.

Em respeito ao princípio democrático que exige a democratização do setor audiovisual, impõe-se a extensão do regime aplicável às rádios comunitárias, com as óbvias e necessárias adaptações, à organização do setor de televisão por radiodifusão de âmbito comunitário.

Tal modalidade televisiva constitui um instrumento a serviço da realização de direitos fundamentais, dentre outros: a liberdade de expressão, direitos culturais, liberdade da informação, comunicação, etc.

De acordo com a Lei n.o 9.612/98, o serviço de radiodifusão comunitária tem por finalidade o atendimento à comunidade beneficiada, sendo os seus objetivos os seguintes: dar oportunidade à difusão de idéias, elementos de cultura, tradições e hábitos sociais da comunidade; oferecer mecanismos à formação e integração da comunidade, estimulando o lazer, a cultura e o convívio social; prestar serviços de utilidade pública, integrando-se aos serviços de defesa civil, sempre que necessário; contribuir para o aperfeiçoamento profissional nas áreas de atuação dos jornalistas com a legislação profissional vigente; e permitir a capacitação dos cidadãos ao exercício do direito de expressão da forma mais acessível possível.

Contudo, a atividade de radiodifusão desempenhada pelas associações de cidadãos não pode ser qualificada pelo legislador como um serviço público. É que esta noção está intimamente ligada à figura do Estado. Ora, a atividade realizada pela administração pública não se confunde com o exercício de direitos fundamentais, mediante os serviços de televisão por radiodifusão. O serviço público é uma das atividades assumidas pelo Estado, servindo precipuamente à concretização dos direitos fundamentais. Todavia, ele, em relação à televisão comunitária, deve limitar-se à realização das atividades de fomento e de polícia administrativa.

Em relação às televisões comunitárias há uma incompatibilidade congênita entre o modo de exercício direto de direitos fundamentais pela atividade de distribuição de sinais de TV para a comunidade com a noção de serviço público. Os direitos fundamentais não são objeto de delegação estatal; situação totalmente diferente é a exigência de uma autorização administrativa para permitir o acesso à atividade de radiodifusão e, por conseqüência, viabilizar o seu respectivo exercício. Em outras palavras, não deve ser confundido o suporte técnico para a realização direta dos direitos fundamentais pelos próprios cidadãos (serviço de televisão por radiodifusão) com a atividade estatal.

Além da necessária previsão legislativa, evidente que a implantação do serviço de TV Comunitária depende de sua viabilidade técnica e econômica. Certamente, haverá mais espaço no espectro eletromagnético para a sua instalação fora das capitais brasileiras, eis que estas encontram-se bastante congestionadas. Daí porque, provavelmente ela encontrará terreno propício para florescimento nas cidades de médio e pequeno porte. E mais, deve-se definir o âmbito de cobertura de seu sinal de modo adequado e proporcional, com a proteção contra as interferências de outros sinais, sob pena de não ser alcançada a sua finalidade substancial que é a de assegurar a comunicação social de alcance comunitário. Ainda, deve-se garantir um regime de financiamento, com a possibilidade de publicidade comercial atrelada às receitas advindas do comércio local, juntamente com fundos públicos de apoio ao seu desenvolvimento.

O fator de identidade da radiodifusão comunitária é a titularidade, a gestão e o controle da parte da sociedade civil, de forma independente do Estado; daí a necessidade de, por exemplo, previsão estatutária de um Conselho Comunitário composto por diversos representantes da comunidade local, independentemente de entidades religiosas, familiares, governamentais e político-partidárias ou comerciais, nos moldes das rádios comunitárias. Nesse caso, deve ser proibida a participação de representantes do poder público em sua gestão e controle, razão pela qual não pode ser qualificada como televisão comunitária uma organização social, eis que ela, por força da legislação, necessariamente há de contar com agentes estatais.

Em síntese, o Estado brasileiro, até o momento, omite-se quanto à disciplina das televisões comunitárias; sequer há sinal de sua respectiva criação no decreto que trata do Sistema Brasileiro de Televisão Digital, enquanto em outros países ela já é uma realidade.

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Flexibilização da Noção Clássica de Serviço Público de TV por Radiodifusão

O entendimento clássico a respeito do serviço público de televisão por radiodifusão está baseado na idéia de estatalidade.
Vale dizer, o Estado é o titular do serviço público de televisão, razão pela qual lhe compete a sua respectiva organização e prestação, de modo direto ou indireto, mediante outorga à livre iniciativa. Este modelo clássico, contudo, limita a a liberdade de radiodifusão na medida em que esta somente pode ser exercida mediante concessão e (ou) permissão.
Tal visão está presente em julgados do STF (por exemplo: Representação nº 1.320-1 - Mato Grosso do Sul e na ADIN nº 561-8 - Distrito Federal).
Criticamos a qualificação tradicional do serviço de televisão como um serviço público privativo do Estado. Entendemos que tal concepção não é adequada à nova realidade normativa inaugurada com a Constituição do Brasil de 1988, em particularmente em relação ao quadro de direitos fundamentais e ao princípio do pluralismo das fontes de informação em termos de radiodifusão representado pelo princípio da complementaridade dos sistemas de radiodifusão público, privado e estatal.
Portanto, a idéia de estatalidade deve ser mantida, contudo sob uma nova roupagem. O serviço de televisão deve ser entendido como uma atividade compartilhada entre o Estado, Sociedade e Mercado.
Nesse sentido, o serviço público de televisão por radiodifusão enquanto serviço privativo do Estado está relacionado à televisão estatal nas suas mais diferentes modalidades, servindo à comunicação institucional dos três poderes públicos e das esferas federativas e em favor da realização dos direitos fundamentais.
Por sua vez, o serviço público de televisão por radiodifusão não privativo do Estado deve ser comprendido como aquela atividade realizada por organizações sociais, isto é, grupos de cidadãos que se associam para produzir e difundir conteúdo audiovisual, a fim de comunicar mensagens de utilidade pública, em favor principalmente da educação e da cultura.
Por outro lado, defendemos que seja afastada a noção clássica de serviço público em relação à televisão comercial. Esta, em oposição à visão tradicional, deve ser focada como uma atividade econômica em sentido estrito, com o objetivo de lucro. E mais, devem ser afastados os institutos da concessão e da permissão em relação à televisão comercial, adotando-se em substituição a figura da autorização adminstrativa, eis que esta é mais favorável à liberdade de radiodifusão.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

Revisão do Modelo de Televisões Educativas

As televisões educativas encontram-se, em sua grande maioria, no âmbito da estrutura das administrações públicas, sendo que, via de regra, são organizadas sob a forma de fundações, ora de direito público, ora de direito privado.

Em função disso, elas estão sob a influência dos governos que procuram imprimir uma determinada visão ideológica quanto ao conteúdo da programação de televisão. Para evitar isto, faz-se necessária a independência dessas estações de televisão para se tornarem de fato e de direito televisões públicas não-estatais, não vinculadas à esfera governamental.

Daí porque um dos caminhos para essa garantia de autonomia é a sua respectiva transformação em organizações sociais (exemplo: Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto — ACERP que possui contrato de gestão com a União) ou organizações civis de interesse público (exemplo: Associação de Desenvolvimento da Radiodifusão de Minas Gerais que possui termo de parceria com a Fundação TV Minas Cultural e Educativa), as quais integram o terceiro setor, voltado à execução de atividades não-exclusivas do Estado, justamente os serviços sociais relacionados à educação e à cultura.

Além dissso, do ponto de vista do direito positivo, faz-se necessária a revisão do conceito de televisão educativa, eis que desatualizado diante do processo de evolução histórico-social. O Decreto-lei nº 236/67 dispõe que a “televisão educativa se destinará à divulgação de programas educacionais, mediante a transmissão de aulas, conferências, palestras e debates” (art. 13).

Evidentemente que não é possível limitar o papel educativo de uma emissora de televisão à veiculação de “aulas, conferências, palestras e debates”, sob pena de comprometer a própria finalidade educacional. Daí porque tal regra há de ser revisada para garantir a autonomia à emissora de televisão para definir os meios pelos quais atenderá ao conteúdo educacional.

E mais, defende-se que as televisões educativas no âmbito da radiodifusão não devem se restringir às universidades, tal como ocorre no modelo dos serviços de TV a cabo. Pelo contrário, é imprescindível estender a faculdade de prestação de serviços às instituições de ensino superior. Em que pese a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional tratar, de modo diferenciado, as duas entidades, não existe razão jurídica que justifique a exclusão delas do sistema de radiodifusão público. Em outras palavras, a finalidade educacional, mediante a atividade de televisão por radiodifusão, pode ser atendida tanto pelas universidades quanto pelas instituições de ensino superior.

Serviço Público de Televisão por Radiodifusão

O serviço público de televisão serve como importante mecanismo de realização dos direitos fundamentais, especialmente os direitos à liberdade de expressão, à educação, à cultura, à liberdade de expressão artística, à informação e à comunicação social, etc. Neste aspecto, ele difere das televisões comunitárias nas quais o exercício dos referidos direitos se faz diretamente pelos cidadãos.
Além disso, o serviço público de televisão atua como fator de resposta às falhas do mercado. Mas seu papel vai além da manutenção do equilíbrio do mercado, na medida em que não se restringe à sua respectiva complementação.
Uma outra missão consiste em ser um efetivo protagonista no setor audiovisual, com uma programação de qualidade, inovadora e plural, com maior vinculação em relação, principalmente, às finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas, previstas no art. 221, I, da CF.
Importante destacar que a manifestação do serviço público é diferenciada nos sistemas de radiodifusão estatal e público.
Na primeira hipótese, ele volta-se ao cumprimento do dever de realização de comunicação institucional que incumbe ao poder público, consoante determinação do art. 37, §1º, da Constituição Federal e, ao mesmo tempo, à satisfação do direito à informação da parte dos cidadãos brasileiros sobre os fatos e/ou atos relacionados ao governo e à administração pública.
Na segunda hipótese, a expressão do serviço público se destina à realização de prestações materiais em termos educacionais e culturais. As televisões educativas constituem o âmbito, por excelência, para a realização dos direitos sociais, especialmente à cultura e à educação.

Por último, é preciso lembrar que a matriz clássica do serviço público de televisão (estruturada com base na universalidade do serviço, na produção e na distribuição de conteúdo diversificado, na gratuidade, e na ampla audiência) deve ser atualizada diante da aplicação da técnica digital, com a flexibilização de seu regime jurídico, especialmente para possibilitar o pagamento, a segmentação da audiência, bem como maiores garantias em relação ao pluralismo cultural. Este tem que ser compreendido nas seguintes dimensões: diversidade de conteúdo, a variedade de fontes de produção e de distribuição e multiplicidade de receptores dos bens culturais.

Conceito de Serviço de Televisão

A palavra televisão é muito utilizada. Contudo, para evitar confusões lingüísticas, é fundamental a compreensão de seu sentido, para permitir a adequada aplicação do direito.
A necessidade de precisar o seu significado é realçada em razão do processo de convergência de tecnologias que permite que um mesmo meio técnico possibilidade a transmissão de dados, imagens, sons, textos etc.
Nesse sentido, adoto a seguinte definição para serviço de televisão: é a atividade de emissão, transmissão e recepção de uma seqüência ordenada de sons e imagens que configura um programa vinculado à programação de conteúdo audiovisual, realizada por redes de difusão, destinada ao público em geral ou a determinada categoria de público (ex: assinantes), com a possibilidade de pagamento ou não, independentemente da tecnologia adotada. Trata-se de um conceito amplo que abrange a tradicional televisão aberta e a televisão por assinatura. Nesse sentido, todos os meios técnicos de difusão do sinal de televisão estão incluídos nesse conceito amplo. Assim, os serviços de televisão por radiodifusão, a cabo, por satélite, MMDS, internet, percentem à noçao ampla.
Em sentido estrito, o conceito de televisão limita-se à tradicional televisão por radiodifusão.
De qualquer modo, a idéia-chave para a compreensão do conceito consiste na seqüência ordenada de sons e imagens que configura uma programação. Com isso, diferencia-se a atividade de televisão do serviço de mera distribuição de conteúdo audiovisual, como é o caso dos vídeos propagados pela internet.

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

STF e a Televisão Pública

Outra missão sob julgamento do STF consiste na ADIN contra Medida Provisória que criou a televisão "pública", intitulada Empresa Brasil de Comunicação, movido pelo Partido Democratas (DEM), sob a relatoria do Ministro Eros Grau do STF.

O partido sustenta a tese de que a medida provisória é contrária à Constituição do Brasil.

Primeiro, argumenta que o referido ato normativo não atende aos pressupostos de relevância e urgência, estabelecidos na Carta Magna enquanto condições para a expedição de uma MP.

Segundo, afirma-se que o mencionado ato é ofensivo ao art. 246 da CF que proíbe a edição de MP na regulamentação de artigo constitucional cuja redação tenha sido alterada por intermédio de emenda promulgada entre 1º de janeiro de 1995 até promulgação da EC nº 6, de 1995.

Terceiro, sustenta-se que o art. 9º, §1º, da MP que autoriza o uso de determinadas dotações orçamentárias com a finalidade de integralizar o capital social da EBC ofende o art. 62, §1º, "d" da CF que proíbe a edição de medida provisória diretrizes orçamentárias e orçamento.

Quarto, a petição inicial demonstra que o art. 25 da MP ao prescrever regime jurídico simplificado para contratação de bens e serviços a ser instituído mediante regulamento também é contrário ao art. 37, XXI, que exige o atendimento ao princípio da legalidade em termos de contratações efetuadas pela administração pública.

Quinto, advoga-se que o art. 25 da MP ao tratar do contrato de gestão celebrado entre a União e a ACERP (Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto) viola o art. 5º, inc. XXXVI, da CF, que protege o ato jurídico perfeito.

Sexto, alega-se que o art. 22 da MP que disciplina a contratação temporária de pessoal técnico e administrativo por tempo determinado é ofensivo ao art. 37, IX, da Cf, o qual exige a observância do princípio do concurso público de provas ou de provas e títulos.

Enfim, diante os fortes argumentos, mais um caso difícil a ser enfrentado pelo STF em sua missão de proteger a Constituição do Brasil. Particularmente, nada tenho contra a instituição da televisão "pública" (em verdade, para mim se trata de uma televisão estatal). Trata-se, aliás, de um ato de concretização do princípio da complementaridade dos sistemas de radiodifusão comercial, público e estatal. O problema está na utilização de um meio normativo não adequado para tarefa como é o caso da medida provisória. Do ponto de vista constitucional, a matéria relativa à organização e disciplina da televisão "pública" deveria ser tratada mediante projeto de lei, submetida, se fosse o caso, ao regime de urgência. Superada essa questão que, em verdade, contamina originariamente a MP, cabe também ao Congresso Nacional a tarefa de contribuir para o aperfeiçoamento do referido projeto concernente à televisão "pública", o que de fato e de direito já está acontecendo mediante a aposição de diversas emendas pelos parlamentares ao texto da medida provisória.

STF e a Televisão Digital

A televisão digital sequer foi implantada em todo o País e já se encontra sob "prova de fogo" diante da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3944 movida pelo Partido Socialismo e Liberdade - PSOL, ajuizada perante o STF, sendo o relator o Ministro Carlos Britto.

O partido político argumenta que o Decreto nº 5.820/2006 que disciplina a implantação do Sistema Brasileiro de Televisão Digital é ofensivo à Constituição do Brasil.

Especificamente, a petição inicial sustenta que o referido decreto é ofensivo à norma constitucional que proíbe a configuração de monopólios e oligopólios nos meios de comunicação social (art. 220, §5, CF), na medida em que possibilita a concentração econômica.

Explico-me. Com a técnica digital, ao invés de uma única programação, é possível que uma mesma emissora de televisão difunda ao público em geral diversas programações mediante a faixa de freqüências de 6MHz. Ou seja, os benefícios decorrentes da otimização tecnológica ao invés de serem repartidos com a coletividade. a fim de permitir a entrada de novos operadores, são apropriados pelas tradicionais emissoras de televisão.

Outro forte argumento consiste na atribuição de novas freqüências às atuais emissoras de televisão exclusivamente pelo Poder Executivo sem a participação do Congresso Nacional, em desrespeito ao art. 223, §1º da Constituição Federal.

Os dois argumentos são igualmente relevantes.

De um lado, a questão do pluralismo democrático que deve ser aprofundado mediante a ampliação do universo de operadores de televisão, abrindo-se espaço para novas emissoras de televisão, sejam comerciais, públicas ou estatais.

De outro lado, a questão da legalidade na medida que uma decisão de alto impacto social e econômico é tomada sem a participação do Congresso Nacional. Este, em verdade, não pode abdicar de sua competência constitucional e deveria fazer uso de sua prerrogativa de sustação do referido decreto.

Não é admissível que os fatos atropelem a jurisdição constitucional a ser exercida pelo STF em defesa dos valores maiores protegidos pela Constituição da República. A sociedade brasileira aguarda uma manifestação favorável à ampliação da democratização do cenário audiovisual.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

Televisão Digital e Televisão de Alta Definição

O modelo de televisão por radiodifusão predominante no século XX foi baseado na técnica analógica para a transmissão dos sinais pelas emissoras, mediante uma rede de antenas terrestres, até as residências dos telespectadores.

No século XXI, um novo modelo de televisão surge com o advento da tecnologia digital. Nesse aspecto, é importante destacar que as expressões televisão digital e televisão de alta definição não são sinônimas. Um dos elementos do sistema de televisão digital é a oferta do serviço de transmissão de imagens e sons com equalidade qualidade, o que se denomina televisão de alta definição (HDTV). Um dos seus aspectos é a qualidade das imagens transmitidas, contudo, como se trata de um sistema, ela é integrada por diversos outros elementos. assim, a televisão de alta definição (HDTV) é uma das possibilidades do sistema de televisão digital, porém não é a única. Ao lado dela, há ainda o sistema de transmissão em definição padrão (SDTV).

A diferença entre as modalidade de transmissão digital reside, basicamente, como já referido, na qualidade dos sons e imagens:
- definição padrão (imagem no formato 4:3 - largura x altura e resolução de 408 linhas, com 704 pontos cada uma, sendo uma tecnologia mais simples e barata);
- alta definição (imagem co formato 16:9 e recepção em aparelhos com 720 linhas de 1.920 pontos, sendo uma tecnologia mais complexa e cara);

Na prática, a transmissão em definição padrão é melhor que a analógica, pois evita interferências. Por sua vez, a transmissão HDTV permite a recepção em qualidade análoga à do cinema, em termos de vídeo e áudio.

Bom, com a televisão digital inúmeras vantagens decorrem da evolução tecnológica: a otimização da utilização do espectro eletromagnético (com a possibilidade de diversas programações em um mesmo canal), versatibilidade (opções diferente quanto à qualidade da transmissão do sinal), flexibilidade do seu uso (adequação do conteúdo em função da capacidade de transporte do sinal), melhor qualidade na recepção do sinal, interatividade (com o potencial de oferecimento de novos serviços pela televisão) e mobilidade (recepção de sinais de televisão mediante aparelhos celulares e em veículos em movimento).